Propagação de plantas
Todos os que adoram e possuem plantas deparam-se sempre com várias problemáticas. Uma delas relaciona-se com o medo em perder uma determinada espécie. Não por falta de água ou de
substrato, mas por vezes devido a factores que nem toda a gente tem sensibilidade para
relacionar com o seu falecimento: pH do solo, temperatura, humidade,
fungos, ...
Como coleccionador de plantas e apaixonado por botânica tenho sempre o
coração nas mãos por causa da vida das espécies que tenho. Se receber uma
planta nova é uma enorme sensação, por outro lado, perdê-la é no mínimo frustrante e triste, e, para muitos,
motivo para desistir. Assim sendo, é importante conhecermos aquilo que temos
nos nossos vasos. Saber o nome popular não chega, devemos conhecer as características
principais tais como nome científico, ciclo de vida, ... e métodos de
propagação.
Muitas vezes precisamos de consultar diferentes fontes para conhecer as
formas mais eficazes de propagação de uma determinada planta, mas outras vezes
conseguimos obter bons resultados de maneira diferente àquela que é
maioritariamente descrita. Formas essas que são próprias de cada um, consequência da descoberta individual fruto de tentativas usadas nos nossos próprios jardins e que acabam por ser bem sucedidas.
Este post irá focar-se na propagação das plantas segundo a minha experiência e alguns meus conhecidos desta área, que aceitaram este desafio de partilhar os seus próprios métodos que realizaram (ou realizam)
com as suas plantas. Cada testemunho tem como título o nome do autor, seguido, casos exista, da sua página/blog com o respetivo link.
Nuno Coutinho
Um dos métodos de propagação de plantas ornamentais é a estacaria. Desta
forma criam-se indivíduos geneticamente iguais à planta-mãe, aumentando a uniformidade
da população.
As hortênsias são uma espécie com primórdios radiculares pré-formados, o
que torna muito fácil e rápido a propagação através de estacaria.
Em Portugal, a minha experiência indica que a melhorar altura para colher
as estacas é entre a primavera e o verão, mas pode ser alargado a todo o ano,
se a planta estiver em condições. Devem colher-se estacas herbáceas, isto é,
ramos do ano, jovens, vigorosos pouco lenhificados, sem gomos florais e com 2-3
pares de folhas. O período de tempo entre a colheita e o enraizamento convém
ser inferior a um dia de modo a evitar as perdas de água por evaporação. Caso
disponha de ensombramento e nebulização este período pode ser alongado.
A preparação das estacas implica: remoção das folhas de baixo; corte da
ponta superior; e uma diminuição da área foliar. De seguida polvilha-se a
base da estaca com auxinas (hormonas) que facilitam a iniciação da formação dos
primórdios radiculares. Os alvéolos escolhidos têm de ser um pouco maiores do
que a altura da estaca e o substrato escolhido deve apresentar uma boa
capacidade de retenção de água, arejamento e fornecimento de nutrientes
(recomenda-se turfa negra).
Após a colocação das estacas nos alvéolos com o substrato rega-se
abundantemente com frequência (para evitar perdas de água por
evaporação/transpiração), mantêm-se as plantas a uma temperatura
amena (15-20 ºC), favorável à diferenciação de tecidos e ao crescimento das
raízes e expõe-se à luz para manter a fotossíntese e haver produção de hidratos
de carbono. 4-6 semanas será visível a formação de novos gomos e a
presença de novas raízes.
Nuno Alves · Um Jardim de Campo
Falar em reprodução assexuada de plantas, ou multiplicação vegetativa, quer
dizer, na prática, reproduzir uma planta através de partes existentes nesta.
Para todos os efeitos, o que se está a fazer é clonagem, uma vez que com este
método de multiplicação está-se a replicar uma planta já existente.
Para mim, a multiplicação vegetativa tem duas grandes vantagens: em
primeiro lugar, permite obter um grande número de plantas de uma só vez e que
se desenvolverão mais rapidamente do que se fossem semeadas; segundo, permite
superar, de forma mais rápida e simples, a limitação associada a algumas
sementes que podem demorar meses, ou até mesmo anos, a germinar. No caso das
flores há uma grande vantagem à parte: muitas das plantas perenes que temos nos
jardins são híbridos estéreis, o que significa que a multiplicação vegetativa é
a única forma de obter novas novas plantas, já que não há produção de semente
fértil.
Há várias formas de o fazer e muitos de nós certamente já terão ouvido
falar em multiplicação por estaca, por mergulhia ou até mesmo na mais obscura
alporquia. Estes métodos são possíveis porque em partes específicas das plantas
existem células com a capacidade de se diferenciarem, ou seja, de se
reconfigurarem para criar raíz e assegurar a sobrevivência da planta. O segredo
está em saber quais são as partes da planta que permitem esse enraizamento. No
meu jardim, experimentei várias técnicas e consegui taxas de sucesso muito
boas. À medida que a minha paixão por plantas e a aprendizagem de novas
técnicas de propagação iam aumentando, também queria aumentar o meu número de
plantas, não só porque gostava delas e queria ter mais, mas também porque, por
algum motivo, elas poderiam morrer. É sempre bom ter um trunfo na manga.
Dependendo das plantas, é possível multiplicá-las através das folhas, dos caules
ou raízes.
Porém, há que ter alguns cuidados. Primeiro, convém esterilizar todas as
ferramentas envolvidas no processo para eliminar todas as bactérias e fungos.
No caso das plantas enxertadas, há que garantir que a multiplicação é feita a
partir de partes da planta acima do enxerto e não de ramos ladrões, caso
contrário o que irá obter é algo bastante diferente do esperado. Além disso,
deve sempre escolher uma planta saudável. Isto porque ao multiplicar a planta,
e porque estamos a falar de clonagem, as gerações futuras levarão consigo todas
as características da planta mãe, inclusive as doenças.
O verão é a melhor altura parar fazer propagação por cuttings, especialmente se o verão foi chuvoso. Os tecidos das plantas estão carregados de água o que significa uma elevada taxa de sucesso nos cuttings. Plantas do género Salvia são muito fáceis de propagar por este método.
Passo 1: Juntar substrato e perlite num vaso, de forma a que a mistura
fique macia e leve;
Passo 2: Recolher alguns ramos saudáveis, que devem estar um pouco lenhificados mas não demasiado velhos. Em caso de dúvida pode recolher-se de diferentes partes a planta e alguma delas irá ser a correta;
Passo 3: Preparação dos cuttings. Deve-se cortar a baixo de um nó e remover essas folhas e depois cortar a cima desse nó removendo todas as eventuais flores e cortar ao meio (corte paralelo ao caule) as folhas de maiores dimensões;
Passo 4: Plantar com cuidado os cuttings num vaso previamente cheio até metade com
a mistura do passo 1;
Passo 5: (opcional) Colocar um pouco de cinzas de madeira para evitar a
aparição de bolor;
Passo 6: Finalmente, cobre-se os vasos com película aderente (a que usamos regularmente na cozinha) e coloca-se num local sem luz direta. Espera-se pelo menos 10 dias até remover a película. Caso exista muita condensação de água faz-se alguns furos na película com um palito.
Passado um mês normalmente os cuttings já enraizaram (taxa de probabilidade 50-70
%, variando de espécie para espécie). Quando as raízes começarem a sair pelos
buracos do vaso é a altura de replantar, individualmente, cada cutting para outro local.
As salvias dispõem de uma grande variedade de espécies, muitas com folhas
com diferentes formas, cores e cheiros.
Uma das formas que mais uso para propagação vegetativa de plantas é a
Divisão simples, talvez a forma mais básica de obter novas plantas vivazes e
uma das que melhor ilustra o conceito de reprodução assexuada passa unicamente
por pegar num maciço maduro da planta em questão e divide-se em duas ou
mais partes.
O único pormenor que devemos ter em conta é preservar o melhor possível o
conjunto radicular: quanto menos danificada estiver a raiz melhores serão os
resultados. De qualquer forma muitas plantas vivazes, às quais se aplica esta
técnica, são bastante resistentes e toleram alguma danificação a quando
divididas.
Para dar início ao processo devemos recorrer a uma colher de jardineiro e
colocá-la à volta da raiz, rodando e empurrando para cima, de forma a
desenterrar a planta. Em seguida com as mãos (ou garfo de jardinagem) separamos
as raízes cuidadosamente para obter as várias partes pretendidas. Como dica
podemos lavar as raízes para que todo esse conjunto fique o mais visível
possível para ser mais fácil perceber onde será a zona de separação.
O tempo fresco do outono e inverno, bem como o pré início do novo ciclo
vegetativo de uma planta, são os momentos mais adequados para se obter os
melhores resultados. Isto porque, a coroa das plantas perenes passa por uma
dormência, tornando-se a zona radicular no grande foco.
A Primula vulgaris (nativa de Portugal), a Achillea
millefolium ou a Stachys lanata são exemplos que uso
recorrentemente no meu jardim e podem ser propagados pelo método referido, bem
como espécies pertencentes aos géneros botânicos Hemerocallis e Echinops.
Os morangueiros também respondem bem à divisão de um conjunto maduro.
Achillea millefolium |
Embora o número de espécies botânicas, ao qual se pode aplicar este método,
seja imenso, não é possível fazê-lo caso o ciclo de vida seja anual ou bienal.
Outra desvantagem deste método (tal como dos outros métodos de reprodução
assexuada) é a perda de diversidade genética, por estarmos a obter um clone da
planta mãe. Como consequência, existe um risco de eventos epidémicos, tais como
a da doença da grafiose do ulmeiro que se disseminou por toda a Europa,
passando por Portugal nos anos 80. Esta doença de origem fúngica propagou-se de
forma desastrosa em espécies tais como Ulmus minor var. vulgaris,
árvore que pode corresponder a um único clone, após reprodução vegetativa pelos
romanos tendo sido posteriormente levada para a Península Ibérica e Reino
Unido. Todas as árvores desta espécie, por conterem o mesmo fundo
genético, sofreram da mesma forma quando expostos à doença grafiose,
levando à quase perda população desta planta.
Fábio Soares · Terra d'Avó
A estacaria
é um dos processos que pode ser aplicado em quase todas as plantas aromáticas.
O género thymus é um dos exemplos que trago.
Passo 1: Cortar/podar ramos do tomilho;
Passo 2: Cortar secção com 3/4cm;
Passo 3: Limpar folhas dos primeiros 3cm e deixar as restantes;
Passo 4: Enterrar a área que foi limpa em substrato para germinar ou outro
qualquer, apertar bem à voltada estaca para que não exista espaço para
desenvolvimento de fungos;
Passo 5: Regar até o substrato ficar húmido mas não encharcado;
Passo 6: Quando aparecer novo desenvolvimento vegetativo deixar que as
raízes se desenvolvam bem;
Passo 7: Mudar para vaso ou jardim.
Thymus mastichina |
Thymus mastichina |
Além do tomilho (thymus) a Salvia elegans também pode ser uma sugestão fácil para aplicar nos passos descritos
anteriormente, mas com o seguinte cuidado. Esta última espécie possui menos
quantidade e um maior espaçamento entre os nós no caule e por isso é preciso
fazer uma estaca com pelo menos 3 nós (o corte é sempre feito a cima de um nó
com um ângulo de 45), arrancar as folhas dos primeiros 2 nós e cortar ao meio
(paralelamente ao caule) as folhas do último nó. É necessário ter o cuidado de
não danificar as gemas entre as folhas pois essas vão dar lugar ao novo
desenvolvimento.
Salvia elegans |
Plantas como o tomilho (possuem muitos nós) não precisamos de agir da mesma forma como a anteriormente descrita.
Gonçalo
Santos · Something
in the Yard
Não há galho que se parta que não vá para dentro de um frasco com água para
tentar enraizar. Foi este o meu pensamento assim que entrei em pânico ao ver um
caule bem grande partido da minha então recente aquisição: Rungia Klossii.
Conhecida popularmente por planta cogumelo, uma espécie que há tanto queria
ter, e que tão pouco conhecia sobre ela. Após ter colocado dentro de água,
começou o meu desespero ao ver que dia após dia as folhas murchavam e caiam.
Nem sinal de raiz. Passaram-se dias, até que reparei que as folhas mais a baixo
do caule e que estavam demolhadas também dentro de água permaneciam e
demonstravam-se bem mais vigorosas que todas as outras. Isto é um bom sinal. A
planta começou a enraizar dentro de água e entretanto já foi para a terra no
jardim, sempre à sombra!
Rungia klossii |
Outra técnica que uso pretende improvisar uma estufa
dentro de um saco de plástico. Ramos que partem, retiro-lhes eventuais flores e
folhas secas, retiro a maioria das folhas (principalmente as de maior
dimensões) e preparo um vaso com furos com uma camada de pedras, manta
permeável e substrato. Rego e espeto o cutting no vaso. De seguida esse vaso
vai para dentro de um saco de plástico (transparente) com fecho zip e coloca-se
esta "estufa" improvisada num local sem luz solar direta. Como a água
evapora dentro do saco e de lá não consegue sair, ela volta ao estado líquido e
desta forma é garantida a água à planta, ou seja, não é preciso regar durante
bastante tempo. O género salvia tem excelentes resultados desta forma, tal como
a Persicaria odorata ou, popularmente, hortelã-vietnamita.
Persicaria odorata |
Todas estas formas são válidas e todos são livres e
aconselhados a testarem as suas próprias técnicas. Usando espécies diferentes e
submetendo a experiência da propagação a diferentes condições. O importante é
salvaguardarmos a existência da nossa coleção, termos sempre pelo menos um
exemplar de reserva. Devemos iniciar este trabalho estudando a bibliografia
sobre as espécies e as formas mais eficazes de propagação. De seguida, temos a
liberdade de encontrar métodos mais eficazes para o nosso fim.
O caule partiu, ou a folha? Não é mal pensado em
tentar propagar a planta através dessas partes. É possível com várias espécies,
outras o melhor mesmo é guardarmos as suas sementes na altura certa.
Sintam-se livres para partilhar os vossos métodos de
propagação com as respetivas espécies botânicas que serviram de cobaias.
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